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Louvre ganha uma nova Diretora

Laurence des Cars é a primeira no cargo em 228 anos de história da instituição

  • O Estado de S. Paulo
  • 28 de maio de 2021
  • Elaine Sciolino Alex Marshall THE NEW YORK TIMES TRADUÇÃO DE ROMINA CÁCIA

Prepare-se, Mona Lisa. Você pode estar prestes a perder seu posto de mulher mais badalada do Louvre. Pela primeira vez, desde sua criação em 1783 após a Revolução Francesa, o Museu do Louvre será dirigido por uma mulher, Laurence des Cars, a atual chefe do Museu d’Orsay e do Museu de l’Orangerie.

Laurence, 54 anos, foi nomeada diretora do museu pelo presidente da França, Emmanuel Macron. “Quatro anos no Orsay me deram essa confiança, essa ideia maluca de que eu poderia ser a próxima diretora do Louvre”, disse Laurence. “O presidente provavelmente viu que eu estava pronta para o trabalho e que, de alguma forma, estou serena.”

Em 1º de setembro, Laurence substituirá o diretor do museu por oito anos, Jean-Luc Martinez, que travou uma intensa campanha na mídia para permanecer por um novo mandato de cinco anos.

Os dois diretores do museu não poderiam ser mais diferentes. Ambos estudaram história da arte na École du Louvre, a prestigiada escola do museu. Mas o Louvre é tradicionalmente administrado por historiadores de arte da classe alta. Martinez, arqueólogo com pouca experiência em pintura, é filho de um carteiro de um subúrbio operário de Paris. Laurence, especialista em pinturas do século 19 e início do século 20, é descendente de família nobre de escritores franceses.

Ela assumirá o museu – que pertence ao Estado francês e tem um orçamento anual de cerca de 240 milhões de euros (ou US$ 291 milhões) e mais de 2 mil funcionários – em um momento difícil. A pandemia freou o turismo internacional, que representava 70% dos visitantes. Antes de a covid-19 se espalhar pelo mundo, o Louvre recebia cerca de 10 milhões de visitantes por ano, fazendo dele o museu mais visitado do mundo.

“Este longo bloqueio total e fechamento de museus tem sido muito doloroso”, disse Laurence.

“O que mais temo é que haja uma tentação de as pessoas se fecharem, que as pessoas fiquem tão inseguras que terão medo do que existe fora de suas casas. Quero abrir portas e janelas e fazer conexões para que as pessoas percebam que há um mundo selvagem inteiro para descobrir.”

A confiança de Laurence vem em parte do papel que ela desempenhou como diretora científica do projeto do Louvre Abu Dhabi, um museu nos Emirados Árabes Unidos que aluga a marca do Louvre e foi inaugurado em 2017.

Ela se tornou diretora do Museu de l’Orangerie em 2014, em seguida, do Museu d’Orsay em 2017, onde foi elogiada por exposições realizadas em colaboração com parceiros como o Metropolitan

Museum of Art. A mostra de 2019 O Modelo Negro: De Géricault a Matisse, que enfocou figuras negras até então esquecidas na arte francesa e foi desenvolvida com a Wallach Art Gallery de Nova York, é considerada um marco de sua gestão. Em março, o Orsay também foi o primeiro museu francês a devolver voluntariamente uma pintura saqueada pelos nazistas.

Laurence já tem planos para grandes mudanças. Comprometeu-se a estender o horário de funcionamento do Louvre até a noite, para atrair visitantes mais jovens. “Os jovens que trabalham podem vir uma hora depois do expediente, jantar no Louvre, ter o prazer de se perder no Louvre”, disse.

Ela espera expandir as parcerias internacionais, especialmente em zonas de guerra vulneráveis e locais como o Sudão, que sofre com saques. O Louvre realiza escavações arqueológicas ao redor do mundo há muito tempo e está trabalhando com a Smithsonian para reconstruir o museu em Mosul, no Iraque, por exemplo. Também está em seus planos criar outro departamento para o Bizâncio e o Cristianismo oriental, que ela diz estar “perdido” no Louvre, e abrir outra entrada para aliviar o congestionamento na entrada principal em formato de pirâmide.

Questionada em relação ao que significa ser uma mulher administrando o maior e mais visitado museu do mundo, ela respondeu: “As coisas estão realmente mudando para as mulheres no mundo dos museus. Dos 70 curadores do Louvre, mais da metade deles é de mulheres. Mais mulheres estão dirigindo museus, especialmente na Europa. E as mulheres mais jovens estão muito mais confiantes hoje em dia”.

Há alguns meses, presumia-se que Martinez, diretor do Louvre desde 2013, teria um terceiro mandato assegurado. Sob sua gestão, o Louvre passou de 10 milhões de visitantes pela primeira vez. A exposição Leonardo atraiu críticas entusiasmadas e um recorde de milhões de visitantes.

No entanto, seus críticos acusaram Martinez de um estilo autoritário que ignorava os conselhos de seus curadores e de desvalorizar a marca do museu ao formar parcerias com marcas como Uniqlo ou permitir que um casal passasse uma noite no museu como parte de uma campanha de marketing para o Airbnb. (O Louvre também alugou seu espaço para Beyoncé e Jay-Z filmarem o videoclipe da canção Apes ** t e aparece com destaque em cenas de Lupin, uma das séries mais vistas da Netflix.)

Em março, depois que uma briga sobre o novo esquema de cores em uma das galerias do Louvre se tornou assunto na imprensa francesa durante uma semana, Henri Loyrette, um ex-diretor do museu, apoiou os críticos de Martinez. Ele testemunhou em um processo movido pela Fundação Cy Twombly e disse que a nova pintura tinha desfigurado um mural de teto do pintor americano abstrato.

Martinez seguirá no museu, reaberto em 19 de maio após meses de fechamento, até o dia 31 de agosto. A partir desta data, ele se tornará um embaixador do patrimônio, responsável por coordenar a participação da França em projetos internacionais.

Laurence soube da decisão de Macron na segunda-feira, 24, quando, ao visitar o Museu d’Orsay com seus pais e outros familiares, recebeu um telefonema da ministra da Cultura, Roselyne Bachelot. “Meu coração bateu muito mais rápido”, disse ela. “O Louvre é o coração de Paris. O edifício em si remonta a 800 anos. É um antigo palácio real que se tornou uma instituição pública que pertence à cultura da França e também aos cidadãos do mundo. Foi um momento bastante emocionante.”